A professora Renata Longui, 40, e a policial Fábia dos Santos, 44, são companheiras há nove anos. Com o amadurecimento da relação, elas começaram a sonhar com a maternidade.
Os filhos adotivos, os irmãos biológicos Giovana e Carlos Henrique, vieram finalmente em fevereiro de 2013, após nove meses de preparação – assim como uma gravidez biológica.
“Eu sempre desejei ser mãe. Então, começamos a conversar a respeito. Pensamos em inseminação artificial também, mas optamos pela adoção.
Fomos apreensivas em uma reunião no Fórum de Jundiaí, por sermos um casal homoafetivo e o tema ainda estar começando a ser discutido, mas a assistente nos disse que isso era comum e que entraríamos no processo de adoção como companheiras, sem problema algum”, relata Renata ao Tribuna de Jundiaí.
Elas começaram então a participar do grupo de apoio à adoção, a juntar a documentação e a fazer todo o processo burocrático.
Passaram pela assistente social, com psicóloga, assistiram várias palestras e tiveram, ao final, um enorme processo de amadurecimento sobre a maternidade que estava por vir.
Elas também tiveram de fazer escolhas, principalmente sobre qual perfil de criança gostariam de adotar.
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“A questão da escolha foi um entrave, porque não queríamos escolher, mas existe uma ficha em que você coloca a idade que gostaria de adotar e outras características. Por fim colocamos que adotaríamos até 13 anos, porque a maioria das pessoas só adota bebês e os maiores sempre ficam no abrigo”, relembra.
Ficha preenchida, elas protocolaram a documentação e passaram a integrar o Cadastro Nacional de Adoção. No dia seguinte, a surpresa: já foram chamadas para conhecer dois irmãos em um abrigo de Campo Limpo Paulista.
“Eu lembro exatamente da primeira vez que os vimos. Lembro quando a Giovana me disse o nome dela, do tom de voz. Lembro que ela estava com um crocs amarelo. Era enorme no pé, ficava saindo. A gente perguntou do irmão dela, também me lembro perfeitamente dela me mostrando onde ele estava. Foi o momento do nascimento deles para nós”.
Na época, a Giovana tinha 5 anos e Carlos Henrique, 7. Eles foram para o abrigo com 9 meses e 2 anos, respectivamente, porque a mãe biológica era usuária de drogas e vivia na rua. Para eles, até então a vida era aquela: o abrigo.
A primeira vez que eles foram para a casa de Flávia e Renata foi em uma véspera de Natal. Naquele ano também passaram a virada do ano juntos e, aos poucos, a convivência passou a ser semanal: os pequenos passavam os finais de semana em sua nova casa, mas pela semana tinham que retornar ao abrigo.
Renata conta que esse foi o momento da aproximação, do amadurecimento dela e da sua companheira como mãe e deles como filhos. “Principalmente na adoção tardia somos como estranhos uns para os outros. Então precisa de ter esse processo. Mas conforme o tempo passava era difícil dar tchau, ficar longe”, lembra.
Adoção tardia
Sobre adoção tardia, Renata diz que é necessário quebrar alguns tabus. “As pessoas pensam que adotando um bebê conseguem moldar a personalidade, como se a criança já não tivesse isso de nascimento. Elas pensam que vai ter mais trabalho, mas não tem nada a ver”, reitera a mãe.
No entanto, ainda assim existem alguns desafios: como foram praticamente criados dentro do abrigo, eles eram muito acostumados com uma rotina de organização intensa e não sabiam o que era ter suas próprias coisas.
“A gente teve que ensinar eles a brincar, a ter seus brinquedos, suas roupas, já que lá era tudo coletivo. Mas também tem muitas delícias, principalmente aproveitar nossa família juntinha’, reflete.
E sobre a adoção, os dois filhos se veem orgulhosos em compartilhar a história da família. Recentemente Carlos Henrique deu seu depoimento a possíveis adotantes e pediu para que eles olhassem menos as características físicas e a idade.
“Ele falou sobre a questão da escolha, sobre o preconceito. A Giovana, sempre pequena branquinha, recebia vários pretendentes para adoção, já ele não, por ser negro. Então ele disse no depoimento: ‘Quando vocês forem escolher, escolham com o coração. Não é só o branco, de olho azul, que tem capacidade. Nós negros também’. Achei incrível, porque ele tem 13 anos e falou de uma forma muito sincera e madura sobre algo que ele passou”.
Duas mães
Hoje Carlos Henrique tem 13 anos e Giovana 12 e, na escola, sempre falam abertamente sobre ter duas mães – o que para eles é completamente normal. Renata conta que uma vez foi buscar a Giovana na escola e ela, ao lado das amigas, pediu para ela confirmar que era verdade que tinha duas mães.
“Ela contou para as amiguinhas, que ficaram super impressionadas e não acreditaram na hora. Quando eu contei elas acharam super legal. As crianças sabem lidar com isso de forma melhor que muitos adultos. Para os amiguinhos deles que vêm em casa fazer trabalhos é muito natural”, diz.
“O Carlos está na Seleção de Basquete de Jundiaí. Dia desses ele teve que fazer um teste físico com alguns exames e o médico perguntou a estatura dos pais. Aí ele disse ‘uma mãe é mais alta e a outra é mais baixa’, e o médico não entendeu. Aí ele disse que era adotado. Começamos a dar risada”, continua Renata.
Questionados sobre como é ter duas mães, os dois responderam a mesma coisa: completamente normal. “Quem não quiser que não entenda, mas o que importa é o meu sentimento com minhas mães e o amor que elas me dão”, diz Carlos.
E, se ter uma mãe já é bom, imagine duas! O Tribuna de Jundiaí ainda perguntou que mensagem eles gostariam de passar para as duas mães nesse domingo.
“Eu gostaria de dizer que amo muito elas, que elas são as pessoas da minha vida”, diz Giovana.
“Elas são as melhores pessoas do mundo, com o coração mais aberto. Eu diria para elas continuarem sendo essas pessoas maravilhosas que são, nos dando amor e carinho”, finaliza Carlos Henrique.