Total de favelas dobra no Brasil em dez anos e 20 milhões estão passando fome
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Economia

Total de favelas dobra no Brasil em dez anos e 20 milhões estão passando fome

Crédito para produtores menores e mudança na tributação sobre consumo são saídas

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Casas dentro da favela
Numero de favelas mais do que dobrou nos últimos dez anos. (Foto: Freepik)

Cerca de 20 milhões de brasileiros declaram passar 24 horas ou mais sem ter o que comer em alguns dias. Mais 24,5 milhões não têm certeza de como se alimentarão no dia a dia e já reduziram quantidade e qualidade do que comem. Outros 74 milhões vivem inseguros sobre se vão acabar passando por isso.

Mais da metade dos brasileiros sofrem de algum tipo de insegurança alimentar, seja grave, moderada ou leve, em dezembro de 2020, segundo levantamento da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan).

Realizada em 1.662 domicílios urbanos e 518 rurais, a pesquisa chegou a esses números antes do repique inflacionário dos últimos meses, o que deve ter agravado ainda mais o quadro.

Em setembro, o índice de difusão do IPCA para alimentos, que mostra o percentual de itens com aumentos, estava em 64%. Em 2019, quando a inflação equivalia a menos da metade da atual, a difusão nos alimentos era pouco superior a 50%. 

De acordo com dados do IBGE mostram que a insegurança alimentar caía no Brasil desde 2004, mas voltou a subir em todas as suas formas a partir de 2014, na esteira da forte recessão de 2015-2016, que encolheu o PIB em 7,2%.

Com o Brasil atravessando uma grande crise fiscal, a pandemia e o governo Jair Bolsonaro (sem partido) desgastando expectativas com arroubos autoritários, o crescimento médio da economia tem sido inferior.

Portanto a criação de empregos informais e pior remunerados prevalece e achatou a renda dos mais pobres. Em seus domicílios, quase toda a renda é gasta em alimentos, transporte e moradia.

Desde 2014, segundo a FGV Social, o rendimento domiciliar real per capita do trabalho caiu de R$249 mensais para R$172, em média, na metade mais pobre do Brasil. Como trata-se só da renda do trabalho, muitos desses domicílios podem ter outros rendimentos, como da Previdência ou do Bolsa Família, mas mesmo assim a queda dá a dimensão do aperto orçamentário dos últimos anos.

Alimentação volta a ser um problema no Brasil com as altas no preço. (Foto: Freepik)

A inflação oficial acumulada entre o fim de 2014 e setembro passado foi de 47,5%, e o valor do dólar mais do que dobrou, com impacto direto no preço dos alimentos e dos custos de produção.

Nas regiões mais pobres do Norte e Nordeste, a fome (insegurança grave) chega a afetar 18% e 14% dos domicílios, respectivamente, ante média nacional de 9%. No Centro-Oeste, pólo produtor do agronegócio, mais de um terço das famílias sofre de insegurança leve.

De acordo com o Daniel Balaban, do United Nations World Food Programme (programa mundial de alimentos da ONU), diferente de muitos países africanos, o Brasil não promoveu mudanças em sua estrutura tributária, o que agrava o consumo com impostos como o ICMS.

A reforma tributária em tramitação no Congresso não prevê alterar isso. Segundo o Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário, a carga de impostos sobre alimentos no Brasil equivale a 22,5%, ante 6,5% na média mundial.

O representante da ONU defende que o Brasil siga o exemplo de outros países que têm progredido no combate à fome ampliando o crédito a pequenos e médios produtores de alimentos.

Com piora em todos os anos desde 2014, a pobreza extrema no Brasil (renda domiciliar per capita inferior a R$261, pelo critério da FGV Social) atinge hoje 27,4 milhões de pessoas.

Nesse percurso, o último reajuste no valor médio dos benefícios do Bolsa Família ocorreu em julho de 2018. Desde então, a inflação oficial medida pelo IPCA acumula alta de 18%, sendo até maior para a baixa renda.

No início do governo Bolsonaro, o valor da cesta básica em São Paulo calculado pelo Procon-SP e o Dieese equivalia a 71% do salário mínimo. No fim de agosto, chegou a 98%. No período, os produtos da cesta aumentaram 52%. O salário mínimo, 10,2%.

Mirando a eleição de 2022, Bolsonaro quer agora mudar o Bolsa Família, que passaria a se chamar Auxilio Brasil, incluiria mais beneficiários e teria um valor médio de R$300, ante os R$190 atuais.

O alto desemprego e a queda da renda nos últimos anos fez explodir o número de favelas no Brasil. Em dez anos, elas mais que dobraram em número e presença nas cidades brasileiras.

Segundo estimativa do IBGE, o total de “aglomerados subnormais” (favelas, palafitas, etc.) saltou de 6.329 em 323 municípios para 13.151 em 734 cidades de 2010 a 2019. Caracterizadas por padrão urbanístico irregular e falta de saneamento básico, as moradias nessas condições aumentaram de 3,2 milhões para 5,1 milhões no período.

Segundo as projeções feitas pelo IBGE, um de cada quatro desses domicílios precários fica nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro; mas a proporção é bem maior em capitais como Belém (55,5% do total de residências), Manaus (53%) e Salvador (42%).

“O Brasil está se tornando um país margeado por favelas. O que não podemos é chegar numa situação de não reversão, embora isso não esteja distante”, afirma Edu Lyra, ex-favelado e fundador do Instituto Gerando Falcões, ONG voltada à promoção social de crianças e adolescentes.

O aumento das favelas brasileiras cresceu apesar de o programa Minha Casa Minha Vida ter construído cerca de 5 milhões de moradias entre 2009 e 2018, quando passou a ser desidratado.

De acordo com a Fundação João Pinheiro, o déficit habitacional brasileiro em 2019 era de 5,8 milhões de moradias. Nesse total estão incluídas cerca de 3 milhões de unidades onde residiam famílias comprometendo mais de 30% da renda com o aluguel.

Com a pandemia e o aumento do desemprego, a favelização ganhou força, com mais pessoas buscando moradias baratas.

Com o a substituição, feita por Bolsonaro, do Minha Casa minha Vida pelo Casa Verde e Amarela, o novo programa agora sofre com a falta de recursos e tem atualmente, segundo o Ministério do Desenvolvimento Regional, cerca de 1.600 obras em andamento, com previsão de construir 230 mil unidades.

Fonte: Folha de S. Paulo

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