Sem condições de pagar por um plano de internet, a família da dona de casa Paula Macedo (34), de Manaus, paga um valor simbólico de R$ 20 para o vizinho, que disponibiliza a rede de wi-fi para os filhos de Paula conseguirem estudar.
“Assim que começou a pandemia, expliquei minha situação para a professora. Disse que não tinha TV para meus filhos acompanharem a aula, nem internet”, conta Paula.
Os filhos da dona de casa, Luan (10) e Lucas (16), contam com a ajuda para acessar os conteúdos das aulas pelo WhatsApp. Mas, como nem sempre a velocidade da internet é o suficiente, a professora de Luan também decidiu entregar as atividades impressas, em casa. “A gente quer encontrar mecanismos para chegar até o aluno, mas é difícil. Como exigimos dele em uma situação dessa?”, comenta Ana Rita de Lacerda.
Veto de projeto de acesso gratuito
Na semana passada, o presidente Jair Bolsonaro vetou integralmente um projeto de lei que garantiria internet grátis para alunos e professores da rede pública do ensino básico no Brasil. O programa, que poderia beneficiar alunos em situação de vulnerabilidade social, como Luan e Lucas, foi negado pelo Presidente da República com a justificativa de que a proposta não apresentava “a estimativa do respectivo impacto orçamentário e financeiro, e aumenta a alta rigidez do orçamento, o que dificulta o cumprimento da meta fiscal e da Regra de Ouro”.
A previsão era de um recurso no valor de R$ 3,5 bilhões da União, que levaria internet e equipamentos para a rede pública de ensino e também para estudantes matriculados em escolas nas comunidades quilombolas e indígenas.
A presidente do CNE (Conselho Nacional de Educação), Maria Helena Guimarães de Castro, aponta que sempre discutiu sobre a importância do acesso dos alunos à internet. Segundo ela, o direito de internet gratuita ultrapassa as barreiras da pandemia. “É importante democratizar o acesso à internet, estimular o aluno no ambiente digital”.
Deputados tentam agora derrubar o veto de Bolsonaro para levar acesso gratuito para alunos e professores da rede pública.
“É lamentável que o governo federal não tenha uma estratégia definida. Alguns estados como São Paulo e Paraná estão garantindo internet gratuita. Mas isso não é suficiente, porque temos um problema nacional”, comenta Maria Helena.
Principais desafios
De acordo com uma pesquisa da Undime (União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação), com apoio do Itaú Social e da Unicef, após ouvir mais de 3,6 mil cidades, a falta de internet e infraestrutura escolas foram apontadas como principais desafios da rede municipal durante a pandemia.
O vice-presidente da Undime, Marcelo Ferreira da Costa, diz que a educação no Brasil carece de um programa nacional, não de ações pontuais. “Os alunos de comunidades vulneráveis e das zonas rurais são os mais prejudicados com a falta de acesso”, disse ao UOL.
O coordenador pedagógico Alcides Neto, de Seabra, Bahia, explica que a região de comunidades indígenas e quilombolas sempre teve condições precárias, mas a pandemia fez com que a desigualdade crescesse ainda mais. Com o objetivo de ajudar a reduzir esse impacto negativo, Neto vai até as casas de cerca de 80 alunos com materiais impressos.