O Governo Federal anuncia um aumento de 20% na conta de luz, em plena pandemia, com a parte mais carente da população impedida de ganhar o seu sustento – o trabalhador informal é o mais penalizado pela covid -, tendo de lutar para não passar fome. Não daria para aumentar o valor do auxílio emergencial?
Aí a questão é a outra ponta do orçamento: a inflação, que pensávamos ter sido enterrada com o Plano Real, ameaça voltar. As novas gerações não se lembram, mas houve uma época em que o salário não chegava à metade do mês. Logo que era recebido ia quase todo para pagar a estocagem de comida, pois caso se deixasse para fazer isso na semana seguinte, os preços teriam dobrado.
Em meio a esse mar de dificuldades, para muitos pagar a conta de luz vai ser um problema.
O que é mais lamentável é que o custo da energia vai continuar subindo. As providências que o poder público está tomando, ao invés de atacar as causas que levaram a esse aumento são, como de hábito, meramente paliativas. Para entender o que está acontecendo é preciso, em primeiro lugar, ver a amplitude dessa questão.
Funciona assim: a falta de chuva impede a manutenção do volume de água necessário para garantir a operação plena das hidrelétricas e, por essa razão, torna necessário, para gerarmos energia suficiente para o País não parar, ligar as termelétricas. Movidas a combustíveis fósseis, as termelétricas geram quilowatt-hora mais caro do que as hidrelétricas, acionadas pela água corrente dos rios.
Então a pessoa pode, legitimamente, pensar: pelo visto a culpa não é de ninguém, mas do regime pluvial. E poderíamos ficar nisso, já que não nos restaria senão lamentar esse fenômeno natural. Só que não. Se forem tomadas providências certas, essa situação pode ser resolvida.
Para começar é preciso deixar claro que a falta de chuva que assola o sudeste brasileiro é parte de um problema maior, negligenciado, muito em razão do negacionismo, há décadas: o desequilíbrio do clima terrestre, fruto do aumento da produção de gases como o dióxido de carbono, causadores do chamado Efeito Estufa. Essa negligência pode ter efeitos ainda mais catastróficos, na medida em que estamos nos aproximando perigosamente do ponto de não retorno, quando o desequilíbrio se torna irreversível, independentemente de qualquer medida que venha a ser tomada.
Mas, concretamente, o que teria a ver o Efeito Estufa com o aumento da conta de luz? É aí que entram os chamados Rios Voadores. As árvores da floresta amazônica funcionam como bombas que puxam as águas do subsolo e as ejetam na atmosfera. O sistema de ventos traz essas águas, pelo ar, até o sudeste, onde elas se precipitam sob a forma de chuva. Sua quantidade é tamanha que os cientistas que fizeram essa descoberta denominaram esse fluxo de Rios Voadores.
Com o desmatamento insano da Amazônia – estamos batendo a cada ano sucessivos recordes de destruição da mata – esses rios estão virando córregos e, com isso, diminuindo a quantidade de chuva que cai na nossa região.
O que fazer, portanto, depende, por um lado, de ações imediatas, ou seja, no caso do sofrimento da população mais carente, vítima da desigualdade social absurda do nosso País, de mudanças urgentes nas prioridades governamentais e, também, nesta emergência, da solidariedade da população. E depende, por outro lado, de ações de médio e longo prazo, de medidas que ataquem a causa desse problema, que, se não forem tomadas, vão agravar a atual situação.
Estamos, na realidade, como dito, pagando o custo do negacionismo. Deixamos de ouvir, nas últimas décadas, os alertas da Ciência. Felizmente isso começa a mudar. Hoje, nos países mais avançados, a população tem cada vez mais consciência ecológica e os governantes estão se dando conta de que é necessário rever as prioridades que têm regido suas nações.
O Brasil tradicionalmente chega atrasado na bola desse jogo. Invariavelmente ficamos no fim da fila na tomada de medidas que promovam avanços socioeconômicos efetivos. Agora mesmo isso está acontecendo: o desmatamento da floresta amazônica, ao invés de diminuir, nos últimos anos tem sido recorde. A preservação do meio ambiente em nosso País está muito aquém do que é necessário.
Com os Rios Voadores continuamente definhando teremos, senão no ano que vem, no seguinte, o mesmo problema que estamos enfrentando agora, só que de forma mais severa.
Isso precisa mudar.
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