
Nataly Ventura da Silva (31) é uma mulher negra que trabalhava como auxiliar de cozinha no hipermercado Atacadão, no Rio de Janeiro. Segundo ela, desde o primeiro dia de trabalho, em março, sofria ataques de racismo e intolerância religiosa por parte de um dos funcionários.
Em relatos, Nataly disse que esse funcionário fazia piadas e referências preconceituosas sobre sua cor da pele e a religião candomblé. “Ele chegou a dizer que desde o dia que eu entrei lá [na cozinha], ele já não gostava de mim”, relatou.
Os casos foram denunciados para a nutricionista responsável pela cozinha e para o canal de atendimento interno da empresa, mas nada foi feito a respeito. Além de o funcionário não ser punido, Nataly ainda diz ter sido avaliada pela supervisora como “influenciável”.
Segundo Nataly, a maioria dos funcionários que trabalhavam na cozinha eram brancos.
A Nataly foi demitida no dia 28 de junho, e logo em seguida mais um ato racista do funcionário. Ao sair do setor de Recursos Humanos e voltar para a cozinha, Nataly encontrou o seu avental com a frase “só para branco usar” escrito em caneta, com a assinatura do homem abaixo.
De acordo com a vítima, a supervisora tomou conhecimento deste fato mas novamente não fez nada a respeito. “Ela apenas riscou a frase, fez vista grossa esse tempo todo. Ele é um racista declarado, e ela mais ainda porque permitiu que tudo chegasse a esse ponto”, lamentou Nataly.
Denúncia ao Ministério Público
A ex-funcionária denunciou, além dos casos de preconceito, os problemas do suspeito com outros funcionários, ao Ministério Público do Trabalho. De acordo com as denúncias, o homem teria machucado uma colega em determinada ocasião.
O Ministério somou R$ 50 milhões em danos coletivos pelo hipermercado, que foi omisso e permitiu o comportamento preconceituoso do funcionário, de acordo com a procuradora do trabalho, Fernanda Diniz. Se o estabelecimento foi condenado, o valor será entregue a instituições voltadas a causas negras.
“Esse funcionário dizia que não gostava de preto, está envolvido em caso de agressão física a uma outra funcionária e nunca foi punido. Neste caso de agressão, a empresa chegou a alegar acidente. Então, eu entendi é que a atitude omissa da empresa permitiu que ele fizesse tudo isso”, destaca Fernanda.
O funcionário só foi desligado da empresa depois da intervenção da MPT, por justa causa, o que, segundo as leis da CLT, também foi uma atitude errada do hipermercado. A Consolidação das Leis do Trabalho diz que a demissão por justa causa deve ocorrer de forma imediata. A atitude, na visão da procuradora, caracteriza perdão do funcionário.
O Ministério propôs que a empresa recontratasse Nataly, em outra unidade, e fizesse o contrato de uma consultoria do movimento negro para conscientização dos outros funcionários. A empresa não aceitou os termos, então as acusações foram levadas para ação na Justiça.
Defesa
O hipermercado se pronunciou dizendo repudiar todo tipo de discriminação e que assim que soube do caso, desligou o funcionário acusado de racismo.
Em nota, a empresa diz “Esclarecemos que a denúncia só foi registrada quando o contrato de experiência da colaboradora já havia sido encerrado e estamos atuando junto ao Ministério Público do Trabalho para colaborar com os esclarecimentos dos fatos. O Atacadão conta com um canal exclusivo para denúncias, que são tratadas com o máximo rigor como demandam questões de preconceito”.