Na última quinta-feira (12), um dia antes do atentado em Suzano completar seis meses, Jenifer Silva Cavalcanti, de 15 anos, sobrevivente do massacre, passou por uma cirurgia. O procedimento foi necessário para remover a bolsa de colostomia que utilizava e para retirar um projétil que ficou alojado perto da coluna.
O primeiro tiro que atingiu Jenifer transpassou seu ombro esquerdo. O segundo, que quase comprometeu seus movimentos, perfurou parte do intestino. Ela conta, em entrevista à Folha de S. Paulo, que aproveitou a poça de sangue para se fingir de morta, enquanto isso, presenciava cenas de horror. “O atirador ainda exigiu que ele clamasse para ficar vivo”, lembra a garota. Foram esses os últimos registros que ela tem do colega Samuel Melquíades de Oliveira, de 16 anos, que, após ser baleado na cabeça, caiu morto a seus pés.
Com acompanhamento psicológico e apego à fé, Jenifer voltou a estudar na Raul Brasil e pretende não sair de lá. “Quero encarar tudo de frente”.
José Antonio Ribeiro, de 61 anos, embora não seja um sobrevivente, ainda vive das lembranças do dia em que a vida de seu filho Cleiton Antonio Ribeiro, 17, lhe foi tirada. Depois do massacre, a esposa, Marlene, foi embora de casa para morar com a irmã em Ferraz de Vasconcelos. José diz que a mulher não consegue retornar, pois tudo a faz lembrar do filho.
Anos mais cedo, o casal perdeu uma filha aos sete anos de idade.
“Eu até sugeri que mudássemos de casa, de cidade e até de estado. Mas ela não decide nada. Só chora”, explicou o aposentado. Mas ele, já se decidiu. Encaixotou os pertences da família e deu prazo à esposa Marlene. “Se ela não se decidir até dezembro, pego meu carro e volto sozinho pra Bahia com meus cachorros”.
De volta à escola Raul Brasil
Na Raul Brasil, Rhyllary Barbosa de Sousa, de 16 anos, a garota que lutou com um dos atiradores abrindo passagem para a fuga de dezenas de estudantes, diz que “os colegas sempre lembram, ficam bravos e tristes, mas é uma coisa que passa”.
Hoje, o colégio estadual conta com três psicólogos que ficam de prontidão, mas para Ana Lúcia Ferreira, representante de Suzano no Sindicato dos Professores do Estado, não é o suficiente. “A escola perdeu sua alma”, comenta. Ela defende que é preciso adaptar o projeto pedagógico. “Só lousa e giz num lugar que passou por todo aquele trauma não resolve”, explica a professora.
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A secretaria de Educação do Estado foi procurada pela Folha e informou que criou programas de assistência psicológica e segurança, mas não respondeu sobre o ensino na Raul Brasil.
A prefeitura de Suzano afirmou que os 41 psicólogos que passaram a atuar na cidade zeraram a fila de atendimentos e prestaram auxílio a cerca de 300 pessoas atingidas diretamente pela tragédia.
Adriana Silveira, presidente da associação “Os Anjos de Realengo”, que reúne as famílias afetadas por massacre similar ao acontecido em Suzano, diz que a Tasso da Silveira, escola do atentado de 2011, implantou, além de questões de segurança, programas de prevenção ao bullying e outros com o objetivo de inserir a família no dia a dia da escola.
“As coisas melhoraram, mas o trauma que sofremos vai demandar cuidados pra sempre. E assim será na Raul Brasil”, completa.
Fonte: Folha de S. Paulo