Sami Mansour
Foto: Arquivo Pessoal

Nos últimos 11 anos, desde a eleição de 2014, o Brasil mergulhou numa polarização política que transformou o debate público em uma disputa de torcidas. Gritar “fora fulano” ou “fora ciclano” virou rotina. Mas, enquanto nos ocupamos dessa guerra emocional, deixamos de discutir aquilo que realmente importa: as políticas públicas capazes de melhorar a vida dos brasileiros e as reformas estruturais dos nossos sistemas político e judicial, essenciais à sobrevivência da nossa democracia.

Dizem que “religião, futebol e política não se discutem”. Pois é justamente aí que está o erro. Religião e futebol são paixões, guiadas por emoção. Já a política, em sua essência, é debate, diálogo e convencimento. É o espaço onde ideias são confrontadas, onde a maioria de hoje pode se tornar minoria amanhã – e vice-versa – porque o que conta são os argumentos, não os gritos.

Quem usa a corrupção como arma para desqualificar o adversário também se engana – ou engana o eleitor. A corrupção no Brasil é sistêmica, enraizada nas esferas federal, estadual e municipal, e não pertence a um partido ou a uma pessoa. Combatê-la exige coragem política e reformas estruturais profundas, começando pelo nosso sistema judicial.

Enquanto a polarização ocupa o centro do palco, perdemos a chance de debater as reformas que realmente podem mudar o país. E não é coincidência: a história já mostrou que extremos se alimentam mutuamente. Foi assim na Europa dos anos 30, quando o auge do comunismo e o avanço dos populismos fascista e nazista criaram um ciclo de radicalização que terminou em tragédia. Aqui, pesquisas mostram que cada extremo representa cerca de 20% do eleitorado. O restante – nós, a maioria – fica refém, obrigado a escolher o “menos pior”.

Se quisermos salvar o Brasil desse caminho perigoso, precisamos voltar às bases da nossa democracia e da nossa República. Primeiro, à laicidade: religião e política devem ocupar espaços separados. Todas as crenças merecem respeito, mas o debate público deve se basear em ideias e no bem-estar das pessoas. Segundo, à separação dos poderes: hoje vemos um Congresso com mais orçamento de investimento que o Executivo e um Judiciário que legisla. Isso corrói as garantias fundamentais da nossa democracia.

Meu apelo também vai aos políticos que, por ambição pessoal – e não por convicção –, se jogam nessa polarização para ganhar votos de um lado ou de outro. Sair da polarização não significa ser neutro, tímido ou “murcho”, como vimos em tantas candidaturas que fracassaram nas últimas eleições. O Brasil não precisa de lideranças que “não cheiram nem fedem”, mas de líderes com convicções claras, capazes de propor políticas públicas concretas e responder às preocupações reais dos brasileiros. Precisamos de lideranças que apontem outro caminho, que enfrentem as reformas urgentes no sistema judicial e no sistema partidário, que tirem o emocional e o irracional do debate político. Só assim poderemos devolver à política o espaço do diálogo, da razão e do compromisso com o futuro do país.

Talvez este artigo seja apenas uma garrafa lançada no oceano de ódio e desconfiança em que vivemos. Mas quem sabe ela chegue a um bom destino. Quem sabe encontre aqueles que, como eu, acreditam que o Brasil não pode mais perder tempo com a política-torcida, enquanto o futuro nos escapa pelas mãos.

Sami Mansour é engenheiro civil com Pre-MBA em Administração de Empresas. Foi Secretário de Desenvolvimento Econômico, Ciência e Tecnologia e Assessor Especial de Cooperação Internacional da Prefeitura de Jundiaí, além de Secretário de Indústria, Comércio e Desenvolvimento Econômico de Itupeva. Com experiência executiva no setor privado no Brasil e no exterior, participa ativamente de debates sobre geopolítica, economia global e políticas públicas.

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