Um casal de Jundiaí decidiu embarcar em uma jornada de estudos na Argentina. Matheus Sene, empresário e agora estudante de medicina, e Gianne Stocco, a química e também estudante, compartilharam as experiências e desafios dessa transição com o Tribuna de Jundiaí.
Matheus conta que o casal decidiu se mudar para a Argentina para realizar o sonho de estudar medicina. “Trocar de profissão e me aprimorar na medicina foram as primeiras motivações. A medicina no Brasil acaba sendo hipervalorizada e o ganho é bem superior a qualquer outra carreira, o que ajuda também a aumentar a motivação por fazer”.
Gianne acrescenta que a maior motivação foi o custo. “O custo de moradia é praticamente o mesmo de Jundiaí. Mas a universidade é pública, gratuita e não tem uma prova de ingresso. Além disso, a universidade que elegemos foi uma das melhores avaliadas na prova do Revalida (para atuar no Brasil).”
A adaptação à cultura argentina trouxe desafios inesperados. Embora Brasil e Argentina compartilhem raízes latinas, o casal de Jundiaí percebeu diferenças significativas. “No começo foi bem complicado. Apesar de sermos todos latinos, a cultura argentina e brasileira são bem diferentes. No meio do dia eles dormem e fecham os estabelecimentos.”
O idioma também ganhou uma classificação alta no ranking das adversidades. “Foi complicado por não termos tanta base do espanhol. Infelizmente, o Brasil não incentiva o aprendizado da língua dos nossos vizinhos”, explica Sene.
“E eu achava que ia ser a maior das dificuldades!”, completa Gianne. “Mas hoje percebo que a maior [dificuldade] é a faculdade mesmo. A questão de estudar em outra metodologia e saber se organizar, necessita de muita maturidade.”
Como citado previamente por Stocco, um dos aspectos mais marcantes foi o sistema de ensino de medicina na Argentina. Matheus, que já possuía uma base sólida como enfermeiro no Brasil, encontrou na Universidade Nacional de Rosário (UNR), uma abordagem totalmente diferente. “O ensino aqui é bem ‘pesado’ em teoria e prática, forçando o aluno a aprender sem ‘preguiça’. A faculdade que estamos é a mais diferente de todas, pois o método é PBL e as matérias são por temários em saúde. O aluno sai aprendendo a ser médico e humano.”
Além disso, o casal destaca que as aulas ocorrem de três a cinco vezes por semana, mas com uma forte ênfase na autossuficiência dos alunos. “Aqui é leitura de livro mesmo”, brinca Matheus.
Já as provas, além de serem orais, exigem argumentação e integração dos conhecimentos adquiridos. E embora isso seja considerado alto padrão de ensino, Gianne ressalta alguns pontos, destacando que o país não oferece grandes incentivos financeiros para os profissionais da área.
“Conversando com conhecidos, vimos que a diferença na valorização do profissional de saúde. Argentina e Brasil são muito diferentes, principalmente neste quesito. O salário é consideravelmente mais baixo, porém não sabemos dizer se é uma questão de hipervalorizarão no Brasil ou desvalorização aqui.”
“O brasileiro ficar na Argentina é apenas por gosto, já que o país tem um dos menores salários da América Latina para médicos”, completa Sene.
Desafios de estudar e morar na Argentina
Morar fora do Brasil traz desafios além dos estudos. Matheus aponta que lidar com trabalho e estudos é com certeza o maior desafio. “Minha família longe gera saudades a cada segundo, mas lido como algo passageiro”. Além disso, a rotina acadêmica intensa exige equilíbrio e muita dedicação.
O custo de vida para estudantes de medicina na Argentina varia de acordo com a cidade. Em Rosário, onde o casal de Jundiaí estuda, o valor médio é de R$ 2 a R$ 2,5 mil mensais, enquanto em Buenos Aires esse custo pode chegar a R$ 3 mil. Esses valores incluem despesas com moradia, alimentação e outros gastos essenciais para a sobrevivência dos estudantes.
Do ponto de vista cultural, Matheus destaca que o maior choque foi o hábito da “siesta”, uma pausa no meio do dia em que os argentinos costumam descansar e muitos estabelecimentos fecham. Além disso, o uso de dinheiro físico é bastante comum, o que também foi uma novidade para o casal brasileiro. “Com certeza a ‘siesta’ no meio do dia e o uso do dinheiro físico para tudo foram os maiores choques”, relembra.
Sobre a relação com outros estudantes internacionais, Matheus menciona que a comunidade é diversa e inclui brasileiros, peruanos, paraguaios, chilenos e colombianos. Embora exista algum preconceito, especialmente contra pessoas negras, ele afirma que essa situação é uma minoria. “Aqui é bem tranquilo, há preconceito de alguns argentinos, mas em uma proporção muito pequena. A gente só não pode falar de futebol com eles que é briga na certa”, brinca.
Planos futuros para o casal de Jundiaí
Apesar de estar imerso nos estudos na Argentina, Matheus não pretende se afastar de suas raízes. “Tenho uma empresa no Brasil, onde quero aumentar meu aprimoramento em medicina para trazer aos clientes e parceiros ainda mais segurança e técnica”, comenta ele, indicando que seu futuro profissional está vinculado ao seu país.
Gianne deixa algumas dicas para aqueles que desejam seguir passos parecidos com os do casal. “Aos que querem estudar fora do Brasil, independentemente do curso ou do país, sugiro que tenham muita organização financeira, maturidade, resistência mental e organização acadêmica. Tudo isso são pontos chaves que não podem faltar nesse tipo de jornada”, pontua. “Ser inconsequente ou imaturo em muitas áreas da vida, principalmente as mais básicas, só vai trazer dificuldades para você mesmo. Então compensa trabalhar nesses pontos antes de dar ‘um passo maior que a perna'”, finaliza.
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