Gabriel mora com a família em Cabreúva, mas trabalha com o pai na borracharia da família, no Eloy Chaves. (Foto: Arquivo pessoal/Reprodução/Folha de S. Paulo)
Gabriel mora com a família em Cabreúva, mas trabalha com o pai na borracharia da família, no Eloy Chaves. (Foto: Arquivo pessoal/Reprodução/Folha de S. Paulo)

Um jovem negro de 17 anos foi alvo de fake News em Jundiaí, no Eloy Chaves. Morador de Cabreúva, todos os dias ele vai ao bairro para ajudar o pai na borracharia da família e, durante os intervalos do trabalho, sai pelas ruas fotografando paisagens e natureza.

No dia 30 de setembro, durante uma sessão de fotos em uma praça do bairro, moradores relataram um jovem com “comportamento suspeito”. A foto de Gabriel passou então a circular entre grupos de WhatsApp, como “suspeito de filmar e tirar fotos de casas”.

Moradores consideraram sessão de fotos como “atitude suspeita”

Segundo reportagem da Folha de S. Paulo, publicada hoje (10), no dia seguinte Gabriel foi comprar um refrigerante próximo da loja do pai e sentiu que estava recebendo olhares de reprovação.

De volta à borracharia, um cliente o mostrou uma lista de mensagens e fotos em que Gabriel aparecia fotografando. “Quem encontrar esse rapaz por favor ligue para o 153, esse indivíduo está tirando foto das casas”, dizia um morador.

Ainda de acordo com a Folha, o vereador Antonio Carlos Albino (PSB) também participou do diálogo. “Se vocês virem esse indivíduo pela rua, já liguem para o 153 porque a viatura da guarda está tentando acha-lo pelo bairro. É um suspeito de estar filmando e tirando foto das casas aí”.

Gabriel começou a perceber uma movimentação estranha no bairro. Viaturas da guarda passavam e olhavam para dentro da borracharia, como o procurando. Preocupado, ele foi com o pai e seu professor de fotografia, Anderson Nakagawa a duas delegacias.

De acordo com a Folha, Gabriel informou que em uma unidade da Polícia, ele foi avisado que não havia crime e se negaram a tomar providências.

“Sugeriram que eu tirasse uma foto com uma folha de papel sulfite com o meu nome escrito por extenso, para evitar problemas no futuro. Quem me fichar”, contou à Folha.

Em outra delegacia, ele foi orientado a pausar as fotografias por pelo menos uma semana. Depois disso, levar consigo um certificado de algum curso de fotógrafo, um crachá, nova fiscal da câmera e andar sempre acompanhado.

Gabriel disse à Folha que, na visão dele, “tem preconceito envolvido, sim”.

“O Eloy Chaves é um bairro que tem muitos fotógrafos, conheço vários deles, estão sempre pela rua e isso nunca tinha acontecendo, e eles são brancos”.

O professor de Gabriel disse ainda que na delegacia, foram “tratados como bandidos”.

Anderson Nakagawa é formado em administração de empresa e está de mudança para o Japão. Ele disse à Folha que sabia sobre a existência do racismo no Brasil, mas nunca tinha visto nada do tipo de maneira tão próxima.

O professor, além de ter dado aulas à Gabriel, também vendeu uma câmera para o garoto.

Agora que eu estava empolgado, porque veria cada vez mais o resultado do que fizemos juntos, eu tive que ir para a delegacia com ele. Tive medo que aparecesse um justiceiro e fosse lá resolver com as próprias mãos na borracharia.

Ou que ele fosse preso e enfiado em um camburão e eu estivesse lá no Japão sem ter como explicar que ele tinha comprado a câmera de mim”, disse à Folha.

Na quarta-feira (9), Gabriel conversou com advogados da capital para entender quais providências podem ser tomadas neste caso.

O vereador Albino foi procurado pela Folha e disse ao veículo que a recorrência recente de crimes no bairro Eloy Chaves fez com que as pessoas ficassem assustadas e agissem assim. Segundo ele, não houve racismo.

Ele completou: “Ninguém fala em momento algum da cor dele. Ninguém diz que ele é branco, azul, rosa, verde ou qualquer outra coisa”. De acordo com a Folha, o vereador disse que imputar racismo a essas ações é obra de um adversário político seu na região que tenta “desconstruir” suas obras devido à proximidade das eleições de 2020.

Ele diz que tomará as providências cabíveis na Justiça contra quem o acusar de racismo.

Segundo Albino, o garoto era um “desconhecido” que não mora no bairro e que, por tirar fotos das casas das pessoas, estava gerando temor. Sobre sua mensagem de áudio, ele diz não ter acionado a guarda, mas apenas sugerido que uma das moradoras, que estava muito assustada, fizesse isso.

Confira algumas fotos já tiradas pelo Gabriel: