Ex-interno da Fundação Casa sorri em foto
Ex-interno da Fundação Casa, hoje ele é conselheiro tutelar - quero ajudar os adolescentes

Jessé Estrela, de 23 anos, é atualmente conselheiro tutelar por Várzea Paulista. Atualmente cursando a faculdade de Direito, ele foi o candidato mais jovem a ganhar a eleição para o Conselho Tutelar e o segundo mais votado. Antes disso, no entanto, ele passou por um longo caminho, que o fez enxergar a importância do trabalho com as crianças e adolescentes – especialmente os menores infratores.

Quando tinha 16 anos, ele também foi um jovem infrator. Por conta de um roubo à uma pizzaria, Jessé foi para a Fundação Casa de Jundiaí, onde passou 8 meses detido. Durante esses meses, ele diz que a Fundação Casa funcionou como um divisor de águas em sua vida. “Foi aqui que eu comecei a pensar e refletir quem eu era e quem eu poderia me tornar. Fazendo essa análise, eu procurei ter um foco, de não desistir nas primeiras dificuldades”, afirmou ao Tribuna de Jundiaí.

Jessé contou ainda que sua adolescência foi conturbada, envolvendo problemas com drogas e ausência dos pais. Ele morava apenas com o pai, mas como ele trabalhava muito, não tinha a figura paterna tão presente. Acabou entrando no mundo do crime, mas percebeu na Fundação Casa que gostaria de ter uma outra vida.

Ele saiu da instituição com 17 anos. Sem saber nem ler e nem escrever, decidiu arrumar um emprego como ajudante de mecânico em Várzea Paulista, para poder pagar um supletivo. O salário, de R$ 600, servia para pagar os R$ 250 do Ensino Médio e pagar as contas da casa e comer. Morando sozinho, Jessé diz que muitas vezes passava fome.

“Eu tive propostas para voltar para o crime, mas eu tinha um foco e isso é muito importante. A partir do Ensino Médio foram surgindo mais oportunidades e eu fiz um tecnológico em Gestão de Políticas Públicas, que me garantiu um estágio na Câmara Municipal. e posteriormente um cargo público Depois disso fiz um intercâmbio no Peru e as coisas foram acontecendo. Agora estou fazendo Direito e fui eleito conselheiro tutelar em Várzea Paulista”, contou.

Atuando dentro do Conselho Tutelar, Jessé vai poder auxiliar o órgão a garantir os direitos da população de até 17 anos. A atuação desse órgão ocorre diante de uma situação de ameaça ou de violação dos direitos com o objetivo de proteger a criança ou o adolescente que está em situação de vulnerabilidade. O conselho não é responsável por atender as crianças e sim atuar para que os órgãos responsáveis realizem o atendimento.

“Pelo fato de ter passado pela Fundação Casa, sempre tive desejo de trabalhar com crianças e adolescentes. Me candidatei e foi um desafio, não pensei nem que seria bem votado. Quero lutar pelos direitos das crianças e do adolescente, especialmente os menores infratores. Eu acredito na recuperação deles, eles podem sair dessa, assim como eu saí”, reiterou Jessé.

Na última terça-feira (19), ele foi visitar esses menores infratores para um bate-papo. Ele falou sobre o estigma que carregam e que não é fácil, muitas vezes, se livrar deles.

“Estou aqui com o coração acelerado, porque um dia era eu aí, sentado onde vocês estão. Vocês são desacreditados por quem está lá fora, mas eu sei, eu sou o exemplo, de que vocês podem. E quem deve acreditar em vocês não são os outros, são vocês mesmos. Vocês ganhavam mais antes, eu sei. Mas vocês querem viver assim, como bandidos? Talvez tenham dinheiro, mas não terão integridade”, falou, na ocasião.

Além do seu trabalho no Conselho Tutelar, Jessé trabalhou voluntariamente com crianças e adolescentes em vulnerabilidade no Peru. Ele também promove jogos de futebol para esses jovens em Várzea Paulista, a fim de aproximá-los do seu contato e dos seus conselhos. “Acredito muito na recuperação deles”, fortaleceu.

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Fundação Casa

Atualmente, são 52 adolescentes internados na unidade de Jundiaí, dentre os que estão em internação e internação provisória. O espaço visa aplicar medidas socioeducativas para os menores de idade que tenham cometido atos infracionais, atuando como um local que visa ressocializar e mostrar novos meios para os adolescentes. Na unidade de Jundiaí, além das aulas normais, os internos participam de cursos de panificação, informática básica e DJ.

Dados estaduais mostram que o número de reincidência – ou seja, de jovens que saem da instituição e retornam – é de 23%. No entanto, o diretor da instituição de Jundiaí, Márcio Valério Ruiz Alves, diz que nem sempre a reincidência significa que aquele jovem está marcado para sempre para o crime, já que há exemplos de menores que passaram mais de uma vez pela internação e seguiram uma vida totalmente diferente.

Ele ainda afirmou que, na maioria das vezes, os jovens vão para a Fundação Casa pelo crime de tráfico. “A estrutura familiar é algo que conta muito, assim como a necessidade que a mídia coloca de conquistar dinheiro e muitas coisas, isso chama a atenção, especialmente pela facilidade de conseguir dinheiro por meio do tráfico. Muitos também têm problemas com drogas, o que desencadeia muitas questões”, finalizou.