Parte da série Adolescência
Foto: Divulgação/ Netflix

No centro da impactante série Adolescência, lançada recentemente pela Netflix, há uma pergunta que perturba e exige reflexão, e aqui vai um alerta de spoiler para quem ainda não assistiu:

O que leva um adolescente de 13 anos a matar uma colega de classe?

A resposta, ao menos em parte, aponta para um universo digital ainda pouco explorado pela maioria dos adultos: a machosfera.

O termo, criado em 2009, descreve uma rede de comunidades on-line voltadas ao público masculino. Dentro desse universo, transitam desde grupos que se sentem excluídos socialmente até vertentes extremistas marcadas por discursos misóginos.

Com o avanço das redes sociais e o favorecimento algorítmico de conteúdos sensacionalistas, a “machosfera” deixou de ser um submundo da internet para alcançar uma audiência global — especialmente entre meninos e adolescentes. Figuras como Andrew Tate, influenciador de masculinidade conhecido por declarações controversas, se tornaram símbolos desse fenômeno.

O roteirista Jack Thorne mergulhou nesse ambiente digital durante o processo de criação da série, buscando compreender como esses conteúdos se conectam à realidade de adolescentes em formação. A obra, portanto, vai além do drama juvenil e se transforma em um alerta sobre o impacto psicológico que discursos de ódio e a hiperexposição on-line podem ter sobre mentes em desenvolvimento.

Crédito: YouTube/ Netflix Brasil

Séries e identificação: entre o acolhimento e o risco

Para aprofundar a análise sobre as representações da série e seus efeitos na saúde mental dos jovens, o Tribuna de Jundiaí conversou com a psicóloga Lais Romero Soltau, que compartilhou observações importantes sobre os riscos e oportunidades que narrativas como essa oferecem.

“Séries que retratam o universo adolescente frequentemente abordam sentimentos de inadequação, crises de identidade, solidão, ansiedade e a busca por pertencimento — elementos muito presentes no desenvolvimento psicológico dessa fase da vida”, afirma Lais.

Segundo ela, quando os personagens demonstram tais emoções, muitos adolescentes podem se sentir representados e acolhidos. No entanto, a psicóloga alerta para possíveis armadilhas: “Pode ser uma identificação saudável, como também um reforço de comportamentos que podem ser vistos enquanto disfuncionais e prejudiciais ao adolescente. Tudo precisa ser analisado dentro de um contexto”.

Na visão de Lais, Adolescência apresenta, de forma geral, um retrato fiel dos desafios enfrentados pelos jovens na atualidade.

“A série traz questões complexas como conflitos familiares, dificuldade de socialização, bullying, os efeitos da internet, saúde mental, descoberta da sexualidade e pressão social. Esses são temas que fazem parte do cotidiano dos jovens e precisam ser discutidos.”

Ela destaca, no entanto, que é necessário considerar o contexto cultural de onde a série se origina e o caráter dramatizado da produção audiovisual.

Machosfera e a influência sobre adolescentes

Embora a entrevista não trate diretamente da “machosfera”, os alertas da psicóloga se aplicam ao contexto em que esses conteúdos são consumidos.

“Temas sensíveis sempre correm um risco, pois nunca se sabe como essas questões vão ser vistas e interpretadas pelas pessoas que assistem. Quando são tratadas de forma sensacionalista, superficial ou sem o devido cuidado, podem gerar ainda mais interpretações equivocadas”, explica. Lais lembra que a romantização de transtornos mentais ou a exposição de violência sem contexto educativo são especialmente perigosas para jovens em sofrimento psíquico.

A psicóloga também ressalta que produções como Adolescência podem ser valiosas ferramentas de diálogo entre pais, educadores e adolescentes. “Essa produção, em específico, é muito boa para os pais, responsáveis e educadores refletirem sobre o quanto eles sabem os conteúdos que os adolescentes estão consumindo na internet, o quanto eles conhecem do mundo dos seus filhos.”

Representatividade e cuidado na abordagem

Por fim, a psicóloga destaca a importância de uma representatividade cuidadosa e plural. “Os profissionais envolvidos têm que entender que existem diferentes realidades e vivências, e que a representatividade é uma forma de ampliar vozes e olhares sobre temas que muitas vezes são subjugados. Mas precisa se ter o cuidado de todos se sentirem vistos de uma forma respeitosa, digna e sensível.”

Adolescência é mais do que uma série usada para “alerta”. É uma provocação necessária sobre os perigos do discurso de ódio, a responsabilidade das plataformas digitais e a urgência de escutar os jovens — antes que seja tarde.

“Acredito que séries assim, são uma oportunidade para assistirem juntos e trocar suas percepções sobre os temas que aparecem, assim como conhecer mais sobre o mundo adolescente, importante ressaltar que tem que ser um momento em que todos se sintam confortáveis e livres de julgamentos.”

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