Atores com síndrome de down
Foto: Divulgação/SESI Jundiaí

“Será que a vida é um sonho ou o sonho é a vida?”. Dom Quixote, o clássico do espanhol Miguel de Cervantes, é o livro mais lido de todos os tempos, além de ter dezenas de adaptações. Agora, o grande herói sonhador ganhou uma releitura única: estreou no Sesi Campinas Amoreiras em agosto e agora está percorrendo o Estado de São Paulo. Todas as sessões são gratuitas. (Confira as informações sobre a temporada no final do texto).

“Down Quixote”, filme com elenco 100% composto por atores com Síndrome de Down. Idealizado, escrito e dirigido por Leonardo Cortez, com fotografia de Patrick Hanser, o filme é o primeiro longa-metragem patrocinado pelo SESI-SP. O projeto conta ainda com produção da Spray Filmes, mesma produtora do longa “Abe” e do canal Quebrando o Tabu.

A produção

O longa traz Diogo (Diogo Junqueira), um jovem com Síndrome de Down que pertence a um grupo de teatro que reproduz grandes clássicos da dramaturgia. No entanto, o projeto mais recente do seu grupo, Dom Quixote, acaba adiado por conta da pandemia. Na solidão do seu exílio na casa da sua tia, em Tiradentes, Diogo mergulha no universo de sua nova peça enquanto decora seu papel. A partir daí, a história de Dom Quixote acontece na cabeça de Diogo.

O filme “Down Quixote” nasceu de uma peça teatral, que se desdobrou para as telonas. Os atores egressos do Grupo ADID de Teatro (criado por Cortez em 1998 e atualmente Nosso Grupo de Teatro da Casa de Cultura Movimentarte), ensaiavam a releitura do clássico. Com a pandemia e o isolamento social, afastados de sua maior paixão, surgiu a ideia de continuar os trabalhos e tornar o sonho realidade.

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Os experientes atores, que já apresentaram mais de uma dezena de peças, estavam acostumados com os palcos. Ainda assim, tiveram que aprender a usar a câmera como nova espectadora de seus trabalhos. Para isso, o grupo encarou um longo processo de preparação que começou ainda de maneira remota e que se desdobrou em ensaios presenciais diários durante quatro meses, conduzidos por Cortez, pelo diretor de fotografia Patrick Hanser e pela preparadora de elenco Glaucia Libertini.

Representatividade

Longe de ser apenas uma encenação da obra de Cervantes, “Down Quixote” traz a visão da pessoa com Síndrome de Down sobre a história do cavaleiro e seu fiel escudeiro. Para isso, o roteiro se abasteceu de contribuições criativas dos próprios atores nos processos de improvisação, transportando esse universo mágico para a realidade da pessoa com deficiência.

A cidade histórica de Tiradentes, onde o filme foi rodado é a nova região da Mancha, onde os devaneios de Dom Quixote se materializam numa mistura entre o onírico e a realidade, permeada de elementos teatrais que escapam do palco e invadem as belas paisagens de Minas Gerais. É em Tiradentes e na cabeça de Dom Quixote que uma locomotiva vira um assustador dragão, a camponesa Aldonza se transforma em Dulcinéia e uma procissão religiosa se confunde com o sequestro de uma princesa.

A figura do cavaleiro Dom Quixote se traduz pela sua lucidez diante de um mundo brutalizado e senil. Ele é um ser de profunda inteligência, bondade e idealismo, que acaba, justamente por isso, sendo vítima de preconceitos, chacotas e perseguições. O elenco, composto 100% por pessoas com Síndrome de Down, carrega um pouco de Dom Quixote em si mesmo, mas também empresta à Cervantes uma visão única, que só eles poderiam ter. Afinal, quem precisa andar a cavalo quando se tem asas?