Foto: Canva
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A inflação por consequência acaba gerando um cenário de incertezas nas economias, assim como desestimula que novos investimentos sejam realizados pela iniciativa privada. O Estado interfere para tentar controlar e manter a estabilidade de preços para garantir a manutenção da atividade econômica e do pleno emprego dos fatores de produção. Os remédios muitas vezes amargos, mas necessários, porem a grande dificuldade é a aplicação da dose correta para evitar agredir órgãos vitais do sistema econômico. Nesse caso especificamente um diagnóstico errado pode levar as autoridades a agir compulsivamente, como ocorrem em casos da elevação da taxa de juros para combater uma inflação de custos ou uma redução de tributos para amenizar o impacto da demanda no conjunto produção.

O Brasil é uma economia que apesar dos avanços nos fundamentos macroeconômicos que permitem alguma estabilidade, entretanto ainda preserva a cultura conservadora perversa na administração da politica monetária e mantem o financiamento da especulação financeira com dinheiro público, com a justificativa de amenizar os riscos aos investidores.

Com um histórico invejável de inflação de dois dígitos em todos os anos entre 1954 e 1994, um recorde mundial absoluto, atingindo o auge de 120,95% em um único mês no inicio da década de 1990, e no acumulado anual atingindo 2.400% consequências de excesso de gastos estatais, indexação e baixa produtividade dos fatores de produção, durante a ditadura militar. Esse modelo desenvolvimentista estruturado por economistas liberais em toda a América pobre, com apoio dos Estados Unidos tinha como objetivo apenas, absorver a obsolescência industrial dos países ricos e permitir a continuidade dos seus avanços tecnológicos e sociais tendo a miséria alheia como alicerce, como abordado na obra “As Veias Abertas da América Latina” do escritor uruguaio Eduardo Galeano.

As interrupções provocadas pela crise sanitária da Covid-19, nas cadeias de suprimentos globalizadas, organizadas para exploração de vantagens competitivas localizadas, ocasionaram rupturas em diversas indústrias elevando a pressão sobre a oferta e gerando um fenômeno misto de tipos de inflação no mesmo tempo (custos e demanda) nas economias ricas, impactando os preços também em nações com estruturas produtivas de base primaria como o Brasil, Turquia, Argentina e Índia.

O Brasil teve algumas particularidades as quais dificultaram uma reação à tempestade, com uma política de preços dolarizada para energia e petróleo pressionando os preços internos e um governo que preferiu adiar uma correção acreditando que a economia se ajustava as condições oferecidas. Um forte estímulo ao consumo de uma faixa da sociedade com uma taxa de juros surpreendentemente baixa para os níveis de produtividades, com os fortes solavancos na politica monetária (juros subiram de 2% a 13%) provavelmente amarrando compromissos com a especulação financeira, sufocando o crédito e desestimulando o investimento. Outra barbeiragem foi à ausência de estoque regulador de alimentos, o que deixa sem proteção as classes mais baixas, que compõe a maioria da população e com a moeda doméstica desvalorizada praticamente toda produção de alimentos é exportada. Essas amarras estimulou a espiral inflacionária e a retração na atividade econômica foi inevitável.

O grande questionamento da sociedade ao Banco Central do Brasil com sua independência, aparentemente forjada para atender aos financistas, é a discrepância entre os indicadores de inflação em outras economias e as taxas de juros, o que determina a taxa real de juros. Inglaterra, Estados Unidos, Canadá, Japão e Zona do Euro todos tem forte pressão na oferta de bens e serviços pressionando os preços e atualmente tem índices de inflação superiores ao do Brasil. Enquanto aplicam doses certeiras de remédios monetários para evitar pressão na taxa real de juros, as quais são negativas, algo comum até na cambaleante Argentina. Com a maior taxa real de juros (8%) o Brasil tem dificuldades em estimular consumo, pois o crédito disponível é dispendioso e a taxa de retorno para o investidor não tem margem para riscos.

Temos frestas de luzes no túnel, o poder de compra da sociedade se recuperando com a valorização da moeda brasileira, os preços internos em deflação constante, as agências de rating dando sinais positivos para os investidores, nível de emprego melhorando apesar da timidez e uma aparente harmonia entre os Poderes da República o que facilita reformas necessárias.

Avante Brasil.

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Everton Araújo é brasileiro, economista e professor.