Comissão do Senado
Foto: Carlos Moura/Agência Senado

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou na quarta-feira (17), por 17 votos a 7, o projeto conhecido como PL da Dosimetria, que reduz penas aplicadas a condenados por crimes ligados aos atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

A proposta, aprovada pela Câmara dos Deputados no último dia 8, segue agora para análise do plenário do Senado. O presidente da Casa, Davi Alcolumbre (União-AP), já incluiu o texto na pauta desta quarta-feira, o que pode acelerar a tramitação e permitir o envio direto para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O que prevê o PL da Dosimetria?

O texto aprovado pela CCJ estabelece mudanças significativas na execução penal para crimes contra o Estado Democrático de Direito. Entre os principais pontos estão:

  • mecanismo para acelerar a progressão de regime de pena para condenados por crimes contra o Estado Democrático de Direito;
  • redução de até 2/3 da pena para vândalos comuns envolvidos nos ataques de 8 de janeiro de 2023;
  • prevalência da pena mais grave em condenações simultâneas por tentativa de golpe de Estado e tentativa de abolição do Estado, em vez da soma das penas.

Além disso, o projeto reduz de 25% para 16% o tempo mínimo de cumprimento da pena em regime fechado para que condenados pelos atos de 8 de janeiro possam pleitear progressão ao regime semiaberto.

Tentativa de adiar votação foi derrotada

A aprovação ocorreu após uma tentativa frustrada de parlamentares do PT de adiar a análise do projeto. Durante a reunião da CCJ, foram apresentados três tipos diferentes de requerimentos com o objetivo de empurrar a discussão para 2026, todos rejeitados.

O avanço do texto contrariou articulações de bastidor e reforçou o esforço da presidência do Senado para encerrar o ano legislativo com a matéria votada.

Manobra do relator evitou retorno à Câmara

Relator do projeto, o senador Esperidião Amin (PP-SC) utilizou uma manobra regimental para evitar que o texto precisasse retornar à Câmara dos Deputados caso fosse alterado no Senado.

Amin modificou o conteúdo da proposta para restringir o novo modelo de progressão de pena exclusivamente aos crimes contra o Estado Democrático de Direito, afastando a possibilidade de que outros tipos de criminosos fossem beneficiados.

A mudança respondeu a críticas da opinião pública, de juristas e de parlamentares, que apontavam brechas no texto aprovado pelos deputados.

Segundo Amin, a versão original poderia beneficiar condenados por crimes como favorecimento à prostituição, condutas previstas na Lei das Organizações Criminosas, coação no curso do processo e incêndio doloso.

Redução de pena e novos critérios

O texto aprovado determina ainda que:

  • em condenações simultâneas por tentativa de golpe de Estado e tentativa de abolição do Estado, prevalecerá a pena mais gravosa;
  • em crimes cometidos em contexto de multidão — como os atos de 8 de janeiro — haverá redução de pena de 1/3 a 2/3, desde que o condenado não seja liderança nem financiador;
  • tempo de estudo e trabalho em prisão domiciliar poderá ser computado para redução da pena.

Impacto direto no caso Bolsonaro

O relator do projeto na Câmara, deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), afirmou que, com as novas regras, Jair Bolsonaro cumpriria apenas 2 anos e quatro meses em regime fechado. O cálculo considera reduções por estudo e o período em que o ex-presidente ficou em prisão domiciliar.

Pelas regras atuais, Bolsonaro só poderia pedir progressão de regime após cerca de sete anos no regime fechado. A Vara de Execuções Penais do Distrito Federal prevê, hoje, progressão ao semiaberto apenas em 23 de abril de 2033.

Alternativa à anistia

O PL da Dosimetria surgiu como uma alternativa política à proposta de anistia total defendida por aliados de Bolsonaro. A estratégia buscou reduzir penas sem conceder perdão integral.

O ex-presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), afirmou que a revisão das penas vinha sendo discutida desde o início do ano. Segundo ele, o objetivo era encontrar uma solução intermediária.

“Para se evitar uma anistia”, disse Pacheco.

“Por mais que essas pessoas tenham atentado contra a democracia, contra as instituições, contra o Brasil, eu, como ex-presidente do Senado e do Congresso, não quero e não gostaria que essas pessoas fossem apenadas além da conta”, afirmou.

Governo nega acordo político

Parlamentares da base governista e da oposição acusaram o Palácio do Planalto de ter mudado sua posição nos últimos dias para permitir o avanço do projeto. O líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), negou qualquer acordo.

Já o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA), admitiu apenas um acordo de procedimento para que a votação ocorresse ainda nesta quarta-feira.

“Assumo aquilo que fiz, que é de acordo de procedimento. Acho que não tinha mais como empurrar [a votação]. O presidente Lula tomará a sua decisão depois [sancionar ou vetar]. Não fiz troca alguma. No mérito, não fiz troca alguma. […] Meu partido fechou questão para votar contra”, declarou.

Pressão pública e manifestações

O texto foi alvo de protestos em diversas cidades do país no último domingo (14), o que influenciou o MDB e integrantes do PSD a declararem posição contrária ao projeto.

Apesar das críticas, Amin garantiu que as alterações aprovadas restringem os benefícios apenas aos condenados pelos atos golpistas de 8 de janeiro e defendeu a urgência da matéria.

“Embora não configure a desejada anistia, busca corrigir distorções, a mão pesada. Há um consenso de que a mão foi pesada”, afirmou.