Foto: Fernanda Serrano/Arquivo Pessoal
Foto: Fernanda Serrano/Arquivo Pessoal

Esperado por mais de 15 anos, a chegada de Henrique foi a realização do sonho da fisioterapeuta Soraya Chicralla Matos e do mecânico Jairo César Poiatto que estavam prestes a viajar a São Paulo para fazer a fertilização in vitro quando souberam da gravidez. Quando o filho nasceu, Soraya estava com 43 anos e fez questão de registrar cada mês com fotos, para inclusive comemorar cada momento ao lado do marido. Enquanto isso, Jairo chorava simplesmente por pegar o menino no colo. “A emoção dele transbordava de verdade”, relembra a mãe.

Neste período, juntamente com as irmãs Kelly e Lyvia, Soraya planejava toda a decoração com bolo, doce e foi assim que os ‘mesversários’ do bebê passaram a ser festejados no núcleo familiar. “Hoje eu entendo a razão de tudo aquilo, essas fotos são os registros deles juntos e vão mostrar para o Henrique o quanto ele era amado pelo pai”, falou emocionada.

O sonho da família foi interrompido pela Covid-19 e a doença levou Jairo no mês de abril deste ano, quando o bebê tinha apenas 9 meses. Soraya, Henrique, os pais, irmã e cunhado também foram infectados. O último registro de Jairo ao lado do filho foi no batizado do pequeno, realizado 3 dias antes da internação. “Ele fez muita questão de batizar o bebê, era muito devoto de nossa senhora e naquele sábado ele estava alegre, comemorando, estava feliz. Os sintomas apareceram no dia seguinte”, relembrou.

Mecânico por vocação e apaixonado pela profissão, Jairo construiu sua oficina ao lado da empresa do sogro e juntos atuavam na área automotiva. Com a morte dele, a família passou a conduzir a oficina e coordenador os 5 funcionários, sendo este o local onde Jairo considerava a “segunda casa” e lá também ministrava cursos da área.

Agora, com o filho, a intenção foi comemorar o primeiro aninho do pequeno vestido com o pai no local onde, há muito tempo, o casal já tinha combinado fazer a comemoração. O gesto se tornou uma homenagem. “Quero que o Henrique cresça sabendo quem foi o pai dele e sinta orgulho do que ele construiu com seu trabalho honesto e coração gigante”, falou Soraya. Para ela, a lembrança do esposo está presente o tempo todo, inclusive na fisionomia do bebê. “Henrique é muito parecido com o pai. Tem mãe que não gosta de ouvir ‘seu bebê é a cara do pai’ mas, para mim, é um grande elogio. O Henrique é mesmo a cara do pai e fico feliz de ver isso todos os dias”.

Nos dois últimos ensaios, de 10 e 11 meses, as fotos já não tinham mais a presença do pai, mas, ainda assim, Soraya continuou postando as fotos sempre agradecendo ao esposo por ter-lhe deixado Henrique. “Foi o Jairo que me convenceu a tentarmos a fertilização. Eu tinha um diagnóstico de trompas obstruídas e depois de muitos exames, já tinha dito para Deus que se fosse para eu engravidar que seria numa única tentativa. Quando já tinha juntado o dinheiro para o procedimento e estávamos planejando a ida a São Paulo, percebi alguns sintomas e resolvi fazer um exame, que deu positivo, engravidei naturalmente. A emoção do Jairo quando soube foi enorme, ficamos os dois atônitos”, sorriu.

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Jairo já tinha uma filha, Natalia, hoje com 23 anos. O menino que veio para completar a felicidade da família era a alegria da rotina do pai: “Ele cuidava, dava banho, fazia mamadeira, fazia questão mesmo de cuidar pessoalmente do Henrique”.

Entre o início dos sintomas e a internação foram apenas 3 dias. Jairo esteve assintomático por um período e quando a situação se agravou ele chegou a ir até o hospital, voltou para casa e depois foi novamente, quando acabou sendo internado. A família lembra dos dias que se seguiram como um pesadelo.

Com o marido intubado, o filho infectado e os pais também doentes, Soraya estava esgotada, assustada mas tentava viver um dia de cada vez. Jairo faleceu no dia do aniversário. Na ocasião, quando a notícia da partida dele se espalhou, o pai de Soraya postou: “No dia do aniversário ele ganhou o presente de estar na presença de Deus”.

Neste mês, a pequena comemoração de 1 aninho do bebê na oficina foi um momento especial para todos. Os funcionários da empresa acompanharam o ensaio e o bolo foi compartilhado entre as pessoas que participavam da rotina de Jairo.

“Foi um momento bonito para ser dividido com a equipe, por conta do distanciamento nós resolvemos nos reunir ali que tem bastante espaço e fazer essa homenagem a ele juntos. Jairo estava muito empolgado com esse ensaio na oficina e quando tudo aconteceu, resolvi manter. Fizemos essas fotos do Henrique vestido como o pai não porque ele morreu, mas por quem ele realmente foi. Jairo foi o pai que ele queria ser, viveu a paternidade como queria viver, então independente dele ter falecido essa homenagem é justa”, ponderou.

Por fim, a mãe fala que Jairo nunca teve vergonha em dizer que era mecânico. “Nós ouvimos muita coisa ao longo desses 16 anos e ele nunca ligou, para ele não fazia a menor diferença. Ele era feliz”. Soraya ainda ressalta que continuará a fazer os registros em família.