
Valéria de Paula, administradora e funcionária pública de Jundiaí, foi impedida de entrar em uma agência da Caixa Econômica Federal de Jundiaí, banco a qual é cliente, na tarde de quarta-feira (27). Para ela, embora ninguém tenha dito algo sobre sua cor, para ela se trata de mais um “caso de racismo velado”.
A confusão começou quando, mesmo deixando seus pertences separados, Valéria continuava sendo impedida pela porta giratória bloqueada. Ela tentou sucessivas vezes até chamar pelo segurança e pedir auxílio para entrar na agência. De acordo com a mulher, o segurança disse que não seria possível liberá-la, pois era procedimento da empresa.
O gerente da unidade veio então para entender o que estava acontecendo e, segundo Valéria, perguntou o que ela faria dentro da agência. Respondendo que estava lá para realizar um depósito, ele pediu que ela fizesse a transação nos caixas eletrônicos.
Valéria tem próteses de titânio no fêmur e quadril e foi orientada ao gerente que apresentasse uma “carteirinha”. Segundo ela, em dez anos, desde que colocou o dispositivo, esta foi a primeira vez que passou pelo que chamou de “constrangimento” e nunca foi orientada por nenhum médico a ter este tipo de documento em posse.
Valéria tentou entrar mais uma vez. Foi nesse momento, de acordo com a mulher, que o segurança disse que chamaria a polícia.
“O que faz eu parecer suspeita?”, questionou a administradora ao segurança. Ela ainda disse ao funcionário: “Pode chamar. Porque agora, se você não chamar, eu vou”.
Racismo?
A Polícia Militar foi até a agência e ouviu as partes envolvidas. Valéria também comunicou seu advogado e grupos do movimento negro, – dos quais ela faz parte – que também foram até a unidade do banco.
No carro, Valéria guardava um Raio-X de um dos exames de rotina. Ela mostrou ao gerente, do lado dos policiais. Foi só então que ele autorizou sua entrada e voltou para o interior do prédio. Ao tentar entrar, mais uma vez, a porta travou e o segurança não permitiu a entrada. Os policiais e advogado solicitaram a chegada do gerente, de novo, que pela segunda vez autorizou e liberou a entrada de Valéria.
“Eles tentaram me impedir de entrar na agência a todo custo. Ninguém pronunciou uma palavra sobre a cor da minha pele, mas qual risco eu apresentava ao segurança quando ele disse que chamaria a polícia?”.
Essa é a primeira vez que a administradora passa por alguma situação dessa magnitude. “Nós enfrentamos olhares que constrangem, comentários, mas eu enfrento e chego de cabeça erguida nos lugares”.
Participante dos movimentos negros desde adolescente, sua família sempre discutiu a questão racial dentro de casa. “Eu sou muito bem resolvida com a minha negritude, mas a gente sabe que não foi a última vez. Quantos de nós vamos passar por isso?”.
A Caixa Econômica Federal, em nota, “esclarece que utiliza portas automáticas giratórias com detectores de metal em suas agências de acordo com a Lei 7.102/83, que disciplina todo o sistema de segurança em estabelecimentos financeiros em território nacional. A CAIXA ressalta que as portas giratórias são utilizadas pelos bancos para impedir o acesso de pessoas armadas às agências, nunca para criar obstáculos ou constrangimentos aos usuários. O objetivo é proteger clientes e empregados do banco”.
Até o fechamento desta reportagem, a empresa não se pronunciou sobre a conduta do segurança, que disse que chamaria a polícia. Caso haja alguma nova informação, o texto será atualizado.
Ato de Resistência contra o Racismo
Alguns movimentos sociais da cidade organizam um ato contra o racismo em Jundiaí.
A iniciativa acontece após o caso que envolveu Gabriel Souza, jovem que teve suas imagens divulgadas em um grupo de moradores do bairro Eloy Chaves de Jundiaí depois de ir até uma praça com sua câmera fotográfica e fazer registros do espaço.
Ele foi considerado suspeito por alguns moradores e o caso ganhou repercussão nacional.
O jovem vai ser homenageado no Ato de Resistência, que acontece no dia 1º de dezembro, das 12h às 20h, na mesma praça em que o jovem foi fotografado sem autorização.
“A ideia principal é fazer uma reaproximação do bairro com o Gabriel. É uma primeira tentativa de reconciliação daquele território com as pessoas negras”, explica Mariana Janeiro, que compõe a organização do encontro.
Segundo Mariana, essa também é uma forma de levar lazer e cultura para outro bairro, fora da região central, e utilizar destas atividades como forma de debate e conscientização.
Além de uma exposição de fotos de Gabriel, algumas inclusive tiradas na praça, o evento vai contar uma feira artística e apresentações de capoeira, maracatu, afoxé, e dos artistas Dj Joker, Mano Will, CAB e Dj Buck. O grupo Favela Sound System também vai estar presente.
O Ato de Resistência contra o Racismo acontece no dia 1º de dezembro na Praça Vereador Arnaldo Lemos ( R. Arnaldo Bernardini Neto – Jd. Ermida 2 – Jundiaí).
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