Os pedidos de socorro envolvendo violência doméstica aumentaram 19,8% desde que o estado de São Paulo adotou as medidas de isolamento social.
O crescimento de quase 20% das ligações de emergência é exibido nos dados inéditos da Secretaria de Segurança Pública obtidos pela Folha de S. Paulo.
Do dia 20 de março a 13 de abril, foram 7.933 chamadas. No ano passado, entre os dias 22 de março a 15 de abril, a Secretaria registou 6.624.
As datas comparativas não são exatas pois o governo estadual utiliza dados com início em uma sexta-feira e concluídos em uma segunda-feira, tendo assim um perfil semelhantes de dias.
Ainda segundo o jornal, os casos registrados entre 8 e 13 de abril mostram um acréscimo nas ocorrências.
Enquanto na primeira etapa (20 de março a 7 de abril), a alta foi de 16,9% em relação a 2019; a segunda etapa mostra um salto de 29,2%. São 2.000 casos anotados neste ano em apenas seis dias, contra 1.548 no período equivalente do ano anterior.
Os dados da Polícia Militar, utilizados para essa análise, embora não contemplem todos os tipos de crime cometidos no ambiente doméstico, são um bom termômetro para entender como o cenário interfere neste gênero de violência.
Os casos registrados pela PM são, muitas vezes, decorrentes de acionamentos feitos por vizinhos ou terceiros que notam a agressão. Além do mais, os registros da Polícia Militar não dependem da oficialização da agressão junto à Polícia Civil, que não acontece por motivos diversos.
Violência doméstica durante a pandemia
Fabíola Sucasas é promotora, parte do grupo de enfrentamento à violência doméstica do Ministério Público de São Paulo e assessora de Direitos Humanos da Procuradoria-geral de Justiça. Para ela, os números poderão agora ser usados para confirmar problemas do confinamento e estudar formas para tentar enfrentá-los.
“A situação de confinamento é um sinal vermelho para as mulheres. E as crianças expostas a essa violência são vítimas tanto quanto”, disse ela.
Segundo a promotora, o confinamento das famílias propicia o aumento das tensões de um relacionamento abusivo, com um agravante: a redução das condições da mulher de buscar ajuda; por isso, quando não há mais alternativa para a vítima, o pedido de socorro é emergencial.
“Segundo informações que tivemos da Secretaria Estadual de Saúde, houve redução drástica dos relatos de violência dentro de casa. Ou seja: a mulheres não estão buscando serviços de atendimento. Elas estão acionando a polícia”.
Fabíola cita fatores como aumento do consumo de álcool, adoecimento mental (ansiedade e depressão, sobretudo) e estresse causado pela falta de recursos, todos presentes no atual período de pandemia/quarentena, como potenciais exacerbadores das tensões domésticas.
“Sabemos que o registro [por parte da vítima] pode ser mais difícil [no período de isolamento social], porque a mulher não consegue sair, e é difícil telefonar. Se os registros já indicam esse aumento é porque ele é real”, defende Carolina Ricardo, diretora executiva do Instituto Sou da Paz. Para ela, faltam ações do governo federal.
Propostas do governo
O aumento da violência doméstica durante a pandemia foi citado pela ministra Damares Alves, dos Direitos Humanos. Ela chegou a reforçar o 180 como número para denúncias.
Carolina não acredita que isso seja suficiente. Para ela, “não dá para dizer que é difícil e pronto”.
“Tem que quebrar a cabeça. Apoiar, criar as redes de apoio. É um momento completamente diferente de tudo que a gente viu. Se a gente continuar buscando os mesmos jeitos de resolver os problemas, não vai resolver, porque o problema é outro”.
Até aqui, a possibilidade de registrar os casos de violência doméstica pela delegacia eletrônica é uma das medidas adotadas pela polícia para combater os casos.
O atendimento pela internet, segundo a delegada Jamila Ferrari, coordenadora das delegacias da mulher em São Paulo, já era planejado, mas foi antecipado por conta do novo cenário de isolamento.
“Buscamos nos antecipar a um fenômeno que ocorreu em outros países, como China, Espanha, França e Estados Unidos, que registraram aumento no número de casos após adotarem medidas de isolamento social”, afirma. “A vítima poderá acessar o site de qualquer dispositivo conectado à internet, o que é essencial em um período em que as mulheres têm dificuldade para sair de casa”.
Segundo o capitão Nelson Cesar Rosa Vieira, chefe da seção de cidadania da Diretoria de Polícia Comunitária e Direitos Humanos da Polícia Militar de São Paulo, todos os casos registrados como violência doméstica são de crimes previstos na Lei Maria da Penha. Além da violência contra mulher, a lei inclui crianças e adolescentes no âmbito familiar, mesmo que o caso tenha ocorrido fora de casa.
Com informações da Folha de S. Paulo.