Das arquibancadas para a cadeira de presidente do clube de futebol. Assim foi o destino de Rodrigo Alves, 30 anos, formado em comércio exterior e pós-graduado em gestão empresarial. Esse jundiaiense que se diz apaixonado pelo Paulista – seu único time do coração – tem nas mãos a chance de salvar o time da falência. Mas a missão é digna de um título mundial.
Os principais adversários são as dívidas do clube, que chegam a R$ 55 milhões, e a desconfiança dos empresários que poderiam ajudar numa sonhada volta à elite do futebol. Para driblar as adversidades, o mandatário tricolor acredita na retomada da credibilidade do clube e no apoio que tem recebido.
No Entrevistão deste domingo (4), Rodrigo Alves fala do que já pôde fazer pelo Paulista, dos planos e também das estratégias para não perder o maior patrimônio: o estádio Dr. Jayme Pinheiro de Ulhoa Cintra – que acumula 12 pedidos de penhora em ações judiciais. Confira:
Tribuna de Jundiaí – Como foi sair das arquibancadas para sentar-se na cadeira de presidente do clube? A mudança foi muito drástica?
Rodrigo Alves – Sempre acompanhei o Paulista como torcedor, líder da torcida (organizada Raça Tricolor). Fazia o meio de campo com a diretoria e sempre ouvi sobre o planejamento do clube, cobrava situações e melhorias. Estava por dentro do que acontecia nos bastidores, mas não o todo do clube. Eu ajudava no que estava ao meu alcance e, com o tempo, entrei no conselho e depois fiz parte da diretoria com o Levada (Rogério Levada, ex-presidente do Paulista). Ele pediu a renúncia e eu assumi. Minha carreira profissional sempre foi voltada à administração, então procuro usar isso agora no Paulista. Trabalhei como comprador e depois na área de importação de componentes eletrônicos. Tenho formação em liderança e, quando assumi o clube, foi uma junção de amor com tudo o que aprendi profissionalmente. Assumi em junho do ano passado, no meio do furacão. Havia um monte de processos estourando, contas atrasadas… só de energia elétrica tinha uma dívida de R$ 30 mil.
Tribuna – E como foi lidar com isso? Quais foram as ações emergenciais?
Rodrigo – Assim que assumimos, montamos um comitê de gestão e fomos enxugando os custos, priorizando as contas que não podiam deixar de ser pagas. Parcelamos as dívidas e equilibramos, buscamos parceiros na cidade. A pandemia impossibilitou que muitos pudessem nos ajudar em espécie, mas acabaram fazendo permutas. Recebemos, por exemplo, o material de construção, as tintas, conseguimos grama sintética para colocar no vestiário e construímos as cabines dos uniformes no vestiário para cada jogador. Teve torcedores, também, que nos ajudaram com a mão de obra. Não tivemos vergonha: saímos batendo na porta das empresas e pedimos! Todas as contribuições foram muito importantes, mas o que mais nos deixou felizes foi termos sido recebidos por todos. Uma das principais missões que tenho, aqui, é mostrar que o Paulista mudou: hoje, são novos pensamentos e uma nova gestão. Com o tempo, queremos resgatar a credibilidade do clube, que estava manchada por todos os acontecimentos anteriores, e o orgulho dos torcedores.
Tribuna – Há alguma mágoa de sua parte com as empresas da cidade? Deveria haver mais apoio até pela força industrial e econômica de Jundiaí?
Rodrigo – Muitos empresários conhecidos nos deram abertura, nos ouviram. Não fecharam ajuda no momento, mas só de ter essa oportunidade de falar com eles sobre os projetos e as ideias, já subimos um degrau. Vamos conseguir provar que o Paulista mudou realmente com o tempo e com essas ajudas que já temos hoje. Não tenho mágoa porque sei do passado, também ficaria com um pé atrás pelo histórico do clube.
Estamos tentando nos reinventar, até pela situação que vivemos na pandemia, e buscar alternativas. Estamos focados nas leis de incentivo e em emendas parlamentares, que podem garantir parcerias com poder público para projetos incentivados.
Nossa meta é realizar um trabalho social com as categorias de base, específico para plantar sementes. O Paulista sempre foi forte na revelação de jogadores e isso precisa voltar. Sabemos do peso que o clube tem, sua tradição e história, e até por isso ninguém quer ver o time ficar de fora de nenhuma competição, mas o ideal seria parar o profissional e trabalhar só com a base. Temos o compromisso de fazer o clube subir, mas a dor de não disputar o profissional nestes 112 anos seria grande demais. Por isso estamos trabalhando para também colocar a equipe em campo quando a Bezinha (Segunda Divisão do Campeonato Estadual) começar.
“Vamos conseguir provar que o Paulista mudou realmente com o tempo e com essas ajudas que já temos hoje. Não tenho mágoa porque sei do passado, também ficaria com um pé atrás pelo histórico do clube. Estamos tentando nos reinventar, até pela situação que estamos vivendo na pandemia, e buscar alternativas”.
Tribuna – Como é ter de planejar as ações do clube em meio às incertezas por causa da Covid19?
Rodrigo – Fizemos a contratação do técnico Ricardo Chuva para a disputa da Bezinha. Apresentamos para ele um projeto e já estipulamos como meta que, em caso de sucesso, o contrato será renovado automaticamente por mais um ano. Ele já está trabalhando no elenco, focado em montar o time para a disputa. Precisamos “amarrar” os jogadores e já estamos observando alguns que estão disputando campeonatos no Mato Grosso, no Nordeste e nas séries A2 e A3 (do Campeonato Paulista). Como tem esse tempo para tratar e negociar, nos dá uma “gordura” para buscar situações diferentes e parceiros. O custo está fora da nossa realidade, hoje, mas vamos buscar um parceiro. A Bezinha tem previsão para (começar em) agosto, então a nossa ideia é fazer a preparação do elenco em junho e julho.
Tribuna – Qual é a dívida do clube?
Rodrigo – Entre R$ 50 milhões e R$ 55 milhões, atualmente. São R$ 20 milhões (em processos judiciais) na (área) trabalhista, entre R$ 15 milhões e R$ 20 milhões na tributária e mais R$ 15 milhões na área cível. Contratamos um escritório de advocacia para nos ajudar nesses processos e cada área tem um especialista para monitorá-los. Estamos tentando, também, desbloquear um dinheiro do clube para pagar essas dívidas.
Só o estádio tem 12 processos com pedido de penhora. Dia 15, agora, era para ter tido outro leilão, mas conseguimos com o nosso jurídico quebrar isso. Era uma dívida tributária que havia sido paga lá atrás e assim derrubamos o leilão. Estamos buscando fazer acordos para segurar o nosso maior patrimônio, mas se caso o estádio chegue a ser vendido, o clube continua vivo. O time se mantém e isso não vai mudar.
A loja do clube, hoje, é a nossa maior fonte de receita. Temos a ideia de espalhar mais delas por Jundiaí e cidades vizinhas, mas a pandemia prejudicou muito neste sentido. Queremos expandir a marca para a região, mas por enquanto investimos no e-commerce, no canal de WhatsApp para as vendas e fazemos a entrega na residência das pessoas. Ela pode passar aqui (no estádio), também, para retirar no (sistema) drive-thru.
“Só o estádio tem 12 processos com pedido de penhora. Dia 15, agora, era para ter tido outro leilão, mas conseguimos com o nosso jurídico quebrar isso. Era uma dívida tributária que havia sido paga lá atrás e assim derrubamos o leilão”.
Tribuna – Qual seu maior sonho à frente do clube?
Rodrigo – Resgatar as categorias de base, desde dezembro estamos fazendo a captação de atletas na região. Parou com fase vermelha, mas vamos retomar assim que for autorizado. Também estamos buscando concluir os projetos da lei de incentivo. Temos metas a cumprir, mas nosso maior sonho é poder sair da Bezinha e subir para a3, mas para isso precisamos montar um time competitivo. Temos de continuar a revitalização do estádio, manter o gramado em dia e, na parte jurídica, estamos focados em equalizar e liquidar as dívidas ano a ano. Em oito anos, quero quitar ou zerar tudo isso.
Tribuna – Quais as melhores recordações que você tem do Paulista?
Rodrigo – Um dos dias mais felizes como torcedor foi aquele título em 1997, em cima do Corinthians, pela Copa São Paulo (dia 26 de janeiro, no estádio do Canindé/SP: 0 a 0 no tempo normal, 1 a 1 na prorrogação e 4 a 3 nos pênaltis). Foi ali que acendeu mesmo a chama de torcedor do Paulista, foi sensacional! Lembro com carinho, também, da vitória contra o River Plate (Libertadores de 2006, dia 5 de abril, por 2 a 1, no Jayme Cintra) e da virada em cima da Ponte Preta, nas quartas-de-final do Paulistão, em 2004 (4 a 3, na prorrogação, dia 20 de março, em Jundiaí). E, claro, os títulos da Copa do Brasil (22 de junho de 2005, em São Januário/RJ, contra o Fluminense) e da Copa Paulista (1999, 2010 e 2011). Um jogo que foi um sufoco, se não me engano foi no Brasileiro de 2005, contra o Bahia, em que estávamos brigando para não cair (dia 10 de setembro, no Jayme Cintra, pelo Brasileiro da Série B). Precisávamos da vitória e foi 3 a 2 para nós, com um gol do Bahia anulado. Um dos gols inesquecíveis foi do Sabiá, em cima do Red Bull, no final do jogo (dia 28 de novembro de 2010, empate por 1 a 1 aos 44 minutos do segundo tempo, do zagueiro Rodrigo Sabiá), que nos deu o título pela melhor campanha. Uma tristeza foi 2007, quando caímos diante do Ipatinga (5 a 2 de virada, dia 24 de novembro, no Jayme Cintra) da Série B para a Série C do Brasileiro. São muitas lembranças, difícil ter uma que se destaque mais.
Tribuna – Raio X: quem é Rodrigo Alves?
Rodrigo – Sou jundiaense, nascido aqui, sempre morei no bairro Eloy Chaves, faço 31 anos em agosto. Apaixonado pelo Paulista, sempre foi meu único time, sou torcedor de frequentar estádio e ir aos jogos fora da cidade. Tenho uma irmã fisioterapeuta e um irmão que está se formando em Comércio Exterior. Sou noivo e pretendo me casar ainda este ano. Meu objetivo de vida, hoje, é colocar o Paulista em uma situação muito melhor do que encontrei… essa é uma das minhas metas de vida!